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montesclaros.com - Ano 25 - segunda-feira, 13 de maio de 2024
 

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Mensagem: (Do livro ´Por Cima dos Telhados, Por Baixo dos Arvoredos´ - Parte 76)

DE VOLTA AO PASSADO

Seriam 9 horas da noite, ou pouco mais. Sentado em uma das cadeiras que havia na calçada da casa em que me hospedara, eu tinha à minha frente a rua em que nascera e vivera a infância, naquele povoado.
A casa que pertencera a meus pais, ao lado, pouco mudara. Quem estaria agora morando ali, naquela casa onde eu nascera e vivera os felizes anos da infância? – Perguntei-me em pensamento.
Minha viagem era de serviço. Eu estava a pensar nas atividades do dia seguinte mas aos poucos minha atenção foi se voltando para um grupo de crianças que brincavam de pique, correndo para um lado e outro, entrando e saindo das sombras que um grupo de mangueiras recortava no clarão da lua.
De onde me encontrava eu enxergava bem os vultos, o contraste das calças escuras e camisas claras e adivinhava os suspensórios de pano, mas não distinguia as feições dos soldados e bandidos de brinquedo.
A cena levou-me ao passado. O sítio era o mesmo. O tempo repetia-se. Há 20 anos eu era um daqueles meninos. Por que não identificar-me com um deles? As crianças são parecidas, umas com as outras. Seria aquele mais esperto?
E passei a lembrar-me do menino esperto, solto como o vento, que eu fôra, a brincar naquela mesma rua, naquele mesmo chão poeirento, sob o mesmo luar, num passado distante.
Que sensação estranha... Sem dúvida, aquele menino mais esperto, seria eu. Só um detalhe faltava. Mas esse detalhe veio de repente, numa coincidência que me emocionou. Assomando à porta, na casa ao lado, uma mulher chamou, com voz clara e forte:
- Luis, vem pra casa, menino! Sai dessa poeira!
Não obtendo resposta, a mãe voltou a chamar.
- Entre pra dentro, Luis. Tá na hora de dormir... Vem depressa...
Tal como acontecia há 20 anos...

NA ESTRADA

Na saída da curva, ao avistar a longa reta, a primeira visão do motorista, pouco adiante, foi dos carros da Polícia Rodoviária, parados no acostamento.
Um policial estava examinando os documentos do motorista de um caminhão e um outro policial aguardava a chegada do próximo, que, no caso, era o dele.
– Tô frito! – Foi seu primeiro pensamento. Mas reduziu a marcha e parou no acostamento. O policial aproximou-se e pediu a documentação.
O motorista apelou para a coragem e fingiu desembaraço.
– Ih, rapaz! Eu tenho documento aqui que não acaba mais...
Veja este aqui. É a carteira de reservista. Primeira categoria! Barra pesada! Um ano e meio no exército!
Esta outra é da Associação dos Repentistas. Eu sou poeta. Escrevo livros de cordel. São histórias muito boas. Em versos e sem ser em versos.
E tem esta que é do INSS. E mais esta. Não é brincadeira não! Hoje em dia, um cristão, pra trabalhar tem de ter documentos que não acabam mais. Mas é bom estar com tudo em ordem, não é?
A cara do policial não mudava. Permanecia impassível. E falou
– E essa garrucha? O cabo está aparecendo debaixo da almofada. Você tem o porte?
– Que é isso, moço! Essa garrucha velha eu acabo de receber agora, na estrada, em pagamento de uma dívida que eu já dava por perdida. Quando chegar na cidade a primeira coisa que vou providenciar é o porte dela.
– E essas balas? – Perguntou o policial apontando um saquinho de plástico entupido de balas.
– Deixe eu ver... Viche! Ah! Isso é tudo bala velha, com a validade vencida, que a gente vai ajuntando pra jogar fora. Para mim elas não valem nada. Se o senhor quiser eu posso dar elas para o senhor.
– E esse passageiro a seu lado? O senhor tem autorização para conduzir passageiro?
– Não é passageiro não, meu amigo! É meu ajudante! Nestas estradas cheias de buracos, quebrando molas e furando pneus e câmaras a toda hora não podemos viajar sem ajudante...
O policial retirou-se e o motorista pôs o carro em marcha. E comentou com o passageiro:
– Vou dizer para o senhor... Essa Polícia Rodoviária é exigente demais. É por essas e outras que o Brasil não vai pra frente...

(continuará, nos próximos dias, até a publicação de todo o livro, que acaba de ser lançado em edição artesanal de apenas 10 volumes. As partes já publicadas podem ser lidas na seção Colunistas - Luiz de Paula)

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